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domingo, 19 de dezembro de 2010


ELE MORREU PARA SALVAR OS MAUS

Lc 19.10

(A história de um corneteiro cristão)

  • Li certa vez um folheto que contava o testemunho de vida de um jovem órfão e doente, e como foi usado por Deus para mudança de vida de um regimento militar inteiro, testemunho este que abaixo transcrevo para partilhar convosco esta história emocionante


Durante o tempo em que prestei serviço na Índia, havia no meu regimento um jovem corneteiro que sempre considerei muito fraco para a vida de soldado; mas nascera no regimento e, portanto fomos obrigados a cuidar dele o melhor que pudemos. O pai, um homem corajoso e destemido, fora morto no campo de batalha. A mãe que  falecera de saudades seis meses depois era filha de um crente sincero. E o filho, que havia sido educado conforme o ensino religioso que ela própria tinha recebido, era o seu retrato – franzino e delicado. Como preferia ir com ela às reuniões de oração em vez de tomar parte nos divertimentos dos outros rapazes, não gostavam dele.

Dois anos depois, quando o pequeno Guilherme tinha catorze anos de idade, o regimento estava acampado para exercícios de tiro. Eu tencionava deixá-lo no quartel, mas o primeiro sargento pediu-me encarecidamente que o levasse: - Anda maldade no ar, meu coronel – disse ele -, e apesar de tratarem mal o rapaz, sua conduta e a sua paciência produzem bom efeito neles; porque ele é um santo, senhor!

Havia, então, alguns homens rudes no regimento, e mal haviam passado quinze dias quando se deram alguns casos de insubordinação. Por isso, jurei que mandaria açoitar imediatamente o culpado de qualquer outro caso de insubordinação que houvesse.

Certa manhã informaram-me que, durante a noite. Os alvos tinham sido demolidos e, portanto não podia realizar-se o exercício de tiro naquele dia. Isto era muito grave. As suspeitas caíram logo sobre os homens da barraca onde estava também o jovem Guilherme, porque alguns deles eram os piores do regimento. Por isso, foram imediatamente presos para serem julgados em conselho de guerra. No decorrer do julgamento provou-se, sem sombras de dúvidas, que o crime fora praticado por um ou mais desses homens. Então, eu disse: - Está provado que o criminoso é um dos prisioneiros. E acrescentei: - Se algum dos homens que dormiram na barraca n° 4 se apresentar voluntariamente para receber o castigo, os outros serão postos em liberdade; mas se assim não for terei de castigar todos, e cada um receberá dez açoites.

Seguiu-se um profundo silêncio. Então, do meio dos prisioneiros, onde, por ser pequeno, estava perfeitamente oculto, Guilherme avançou e disse:

- Meu coronel, V. Exª, deu a sua palavra de que se alguém se apresentasse para receber o castigo, os outros seriam postos em liberdade; eu estou pronto para receber o castigo.

Fiquei mudo de espanto; depois num ímpeto de ira e desprezo, disse: - Não haverá entre vós um homem digno desse nome? Serão todos covardes para deixar sofrer este rapaz pelas suas culpas? Sim, porque todos sabem muito bem que ele está inocente! Mas ficaram silenciosos e carrancudos, sem proferir uma só palavra.


Então voltei-me para o rapaz, cujo olhar pacífico e suplicante estava fixo em mim, e confesso que nunca, em toda a minha vida, me tenho encontrado em situação tão aflitiva. Eu sabia que tinha de cumprir a minha palavra, e o rapaz também o sabia, quando repetiu: - Estou pronto, meu coronel.


Com o coração dilacerado, dei a ordem, e ele foi levado para o lugar do castigo. Sofreu um, dois, três açoites nas costas nuas. Ao quarto açoite soltou um leve gemido, mas antes do quinto ouviu-se um grito rouco no grupo de prisioneiros, que tinham sido obrigados a presenciar aquela cena, e, de repente, Tiago Stykes, o pior homem do regimento, agarrou o chicote, gritando por entre soluços: - Faça o favor de parar com isso, meu coronel; e mande açoitar-me em vez do rapaz. O culpado sou eu, e não ele. E, com o semblante angustiado, abraçou Guilherme.


Quase a desmaiar, Guilherme olhou para o homem e sorriu, mas que sorriso!


- Não, Tiago – murmurou ele -, agora estás salvo, a palavra do coronel está dada. Em seguida desmaiou.


No dia seguinte, no caminho para a barraca hospital, onde estava o rapaz, encontrei o médico. – Como está o rapaz?


- Está cada vez pior, coronel – respondeu ele.


- O quê? – exclamei horrorizado com aquelas palavras.


- Sim, senhor, o castigo foi duro demais para as suas forças. Há alguns meses que eu sei que a morte dele era questão de pouco tempo e este caso veio a abreviá-la. – Depois , acrescentou: - Este é mais do céu que da terra. E, com os olhos marejados de lágrimas, afastou-se para me deixar entrar na barraca.


O rapaz estava encostado às almofadas, e o seu rosto era, agora, pálido como o de um defunto, mas os olhos tinham um brilho extraordinário e meigo; a seu lado, de joelhos, estava Tiago Stykes. Este levantou a cabeça, e eu vi as gotas de suor que corriam de sua testa, enquanto murmurava, soluçando:


- Por que foi que fizeste isso, rapaz? Por que foi?


- Porque quis sofrer por ti Tiago – respondeu Guilherme com ternura. – Pensei que se o fizesse te ajudaria a compreender como Cristo morreu por ti.


- Porque Cristo morreu por mim! – repetiu o homem.


- Sim, Ele morreu por ti porque te amou, assim como eu te amo, Tiago; mas Cristo te ama muito mais. Eu sofri só por uma culpa, mas Cristo sofreu o castigo de todos os teus pecados. Esse castigo era a morte, e Cristo morreu por ti.


- Cristo não se importa com um homem como eu, rapaz; eu sou muito mau, como tu deves saber.


- Mas Ele sofreu para salvar os maus. Ele mesmo diz: “Eu não vim chamar os justos, mas sim os pecadores ao arrependimento”. Querido Tiago – e a sua voz, agora, implorava: - terá o Senhor morrido em vão? Ouve, Ele chama-te; verteu o seu sangue por ti; bate à porta do teu coração. Não queres deixá-lo entrar? Faltou-lhe a voz, mas colocou a mão na cabeça inclinada do homem.


De pé, ali, na sombra, eu estava profundamente comovido. Tinha ouvido aquelas palavras havia muitos anos. A recordação de minha mãe, que eu tanto amara, voltou à minha memória; aquelas palavras pareciam o próprio eco das suas. Não sei quanto tempo ali estive, mas fui despertado por um grito rouco do homem, e depois vi que Guilherme tinha desmaiado. Pensei que já não vivia, mas algumas gotas do licor, que estava sobre a mesa reanimaram-no. Abriu os olhos, mas a vista estava embaciada. “Canta, ó minha mãe – murmurou ele – o hino Às portas de Pérola; estou tão cansado!” De súbito, as palavras desse cântico voltaram à minha memória, tinha ouvido essas palavras em tempo passados, e repeti-as baixinho ao rapaz, concluído com a linha: Às portas de Pérola; à cidade de Deus.


- Muito obrigado, meu coronel – murmurou ele – daqui a pouco lá estarei.


O tom de confiança com que falava parecia tão natural que perguntei involuntariamente – Onde?


- No céu, meu coronel. A chamada já soou para mim; as portas estão abertas; o preço está pago! Depois, repetiu algumas palavras de um de seus cânticos preferidos, olhou para mim mais uma vez, e disse: - Meu coronel, ajude-o, sim? E, pondo a mão sobre a cabeça do homem, ainda prostrado a seu lado, insistiu: - ajude-o a encontrar o caminho que vai às Portas de Pérola.


De repente, uma luz gloriosa brilhou nos seus olhos moribundos e com um grito jubiloso estendeu os braços como para abraçar alguém e exclamou: - Minha mãe, minha mãe! Lentamente, os braços caíram, a luz esvaneceu-se de seus olhos e o espírito destemido desse rapaz bondoso tinha voado para Deus.
         Wilhelm Weber, Frohnausen, Postfach 45, D-6340 Dillenburg 2 W. –Germany.
                                                            Transcrito por: João Quinteiro Cavalheiro



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